Um ano depois das “jornadas de junho”, ARTIGO 19 lança site que analisa violações cometidas nos protestos no Brasil em 2013

Quase um ano depois de o Brasil ter sido palco da maior onda de manifestações das últimas décadas – as chamadas “jornadas de junho” –, a ARTIGO 19 lança hoje (2) o site “Protestos Brasil 2013” (www.artigo19.org/protestos), uma versão digital do relatório homônimo, que busca fazer um registro sobre a série de violações ocorridas durante os protestos de todo o ano passado.

O site traz números, infográficos, análises de leis e depoimentos de vítimas de violência e especialistas, além de críticas a abusos na atuação do Estado. Baseado em notícias da imprensa, o relatório, que serve de base para o site, contabilizou 696 protestos no país durante 2013, registrando 2.608 detidos e 8 mortes em circunstâncias relacionadas aos protestos. A análise também computou 117 jornalistas feridos e/ou agredidos, e outros 10 que foram detidos.

Os principais abusos cometidos durante o emprego da força policial também são examinados. Na lista, estão a ausência de identificação de policiais, o uso indiscriminado de armas menos letais, como balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo , e a prática de detenções arbitrárias em larga escala. O relatório indica ainda cinco princípios da ONU que deveriam reger a ação de agentes de segurança pública: legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência.

Todas as violações registradas contradizem uma série de convenções e leis internacionais que tratam do direito a manifestação. No caso da ausência de identificação de policiais, a ONU expressa a importância da identificação visível nos uniformes de policiais para a responsabilização de culpados no caso de violações a direitos humanos.

Já na questão das detenções arbitrárias em larga escala, o relatório menciona a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que assinala que “policiais não podem prender manifestantes quando os mesmos estão agindo pacífica e legalmente e que mera desordem não é suficiente para justificar detenções”, contrariando o expediente da “prisão por averiguação” aplicado durante as manifestações.

Para a diretora-executiva da ARTIGO 19, Paula Martins, todas as violações registradas refletem uma postura militarista que ainda permeia o Estado brasileiro. “Apesar de vivermos em uma democracia, nossa polícia parece funcionar com a mentalidade da época da ditadura”, afirma.

??Tipos penais

Outro alvo de crítica são os tipos penais usados para enquadrar detidos em manifestações. Diversos deles foram acusados por “associação criminosa”, “constituição de milícia privada” e até “sabotagem”, esta última presente na Lei de Segurança Nacional. “Somente por estarem no mesmo local e manifestando a favor de um mesmo tema e sem nenhum indício de que foram à manifestação com o intuito de cometer qualquer crime, indivíduos foram detidos e processados por associação criminosa”, diz o texto do relatório.

O relatório destaca ainda os Projetos de Lei (PL) propostos nas casas legislativas federais, estaduais e municipais que buscam abranger manifestações de rua. Entre os mais de 20 PLs identificados, a esmagadora maioria, segundo a ARTIGO 19, continha sinais claros de criminalização de manifestantes. Destaque para o PL 508/2013, que aumenta a pena de lesão corporal, caso seja cometida em protestos, e cria o crime de “dano em manifestações públicas”, com pena de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa. Para efeito de comparação, esse PL, se aprovado, aumentaria em quatro vezes a pena mínima atual para o crime de dano qualificado, e em 24 vezes a pena para a figura simples do mesmo crime.

Segundo o relatório, apesar de ser um direito garantido constitucionalmente, o que se vê atualmente no Brasil é uma preocupante lacuna jurídica no que diz respeito à proteção do direito de protesto. Um exemplo disso é a ausência de legislação específica que regulamente a utilização do uso da força policial em protestos e que siga padrões internacionais.

“Algumas normas já aprovadas também preocupam, como a Lei Geral da Copa, que proíbe manifestações ao redor dos estádios que não sejam consideradas ‘festivas e amigáveis’, abrindo espaço para que alguns protestos sejam considerados ilegais dependendo de sua natureza, sem sequer deixar claro quem seria responsável por tal análise ou quais seriam os critérios para tal classificação”, afirma Martins. “Esses projetos de lei e normas já aprovadas usam de linguagem muito ampla e certamente podem dar ensejo a restrições indevidas à liberdade de expressão”, conclui.

Análises sobre o comportamento do Judiciário também estão no site. Entre os casos expostos, estão o de uma juíza de Minas Gerais que proibiu sete manifestantes detidos de participar de quaisquer outros protestos no futuro, medida que, segundo a ARTIGO 19, se configura em censura prévia ao direito a manifestação.

Quem acessar o site também poderá ver entrevistas com especialistas, como a urbanista e ex-Relatora Especial da ONU Raquel Rolnik, o professor de jornalismo da USP Eugênio Bucci, e os professores de Relações Internacionais Reginaldo Nasser e de Ciências Políticas Pedro Fassoni, ambos da PUC-SP. A página oferece ainda uma linha do tempo com os principais protestos no mundo dos anos 2000 até os dias de hoje.
?
_______________________________________________
A ARTIGO 19 é uma organização internacional de direitos humanos que atua na defesa e promoção da liberdade de expressão e do acesso à informação pública. Com sede no Reino Unido, tem escritórios regionais em Bangladesh, Brasil, Estados Unidos, Quênia, México, Senegal e Tunísia. Seu nome se refere ao artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que trata do direito à liberdade de expressão e informação –  http://www.artigo19.org| http://www.facebook.com/artigo19brasil

Leia Mais...

Projeto de lei antiterrorismo ameaça direito de manifestação

Sob pressão da mídia e ignorando discussões internacionais sobre o tema, parlamentares tentam apressar projetos de lei que criminalizam manifestações de rua e movimentos sociais

O direito de livre manifestação dos brasileiros está sob ataque. Essa é a avaliação de Organizações da Sociedade Civil a respeito de uma série de projetos em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado que visam endurecer de diversas maneiras a legislação e ameaçam criminalizar protestos de rua.

O mais falado deles é o PLS 499/13, chamado de Lei Antiterrorismo, proposta resgatada no Senado como uma resposta à trágica morte do cinegrafista Santiago Andrade, atingido por um rojão disparado por manifestantes durante confronto com a polícia no Rio de Janeiro. Com artigos vagos e abrindo espaço para interpretações que tratem movimentos sociais como criminosos, a lei tem sido vista como um ataque aos direitos de manifestação e organização.

O PL é um entre 14 outros projetos em tramitação nas duas Casas do Legislativo que afetam as manifestações de rua, segundo levantamento publicado pela ONG Artigo 19.

Em nota pública, a Abong alertou para as tentativas de “criminalizar o protesto”, ameaçando o direito de expressão.  “Para quem viveu na ditadura, ou para quem conhece um pouco da história do nosso país, parece que estão querendo ressuscitar a ‘Lei de Segurança Nacional’. Estão querendo criminalizar o protesto. Estão querendo caracterizar manifestações como risco para a segurança dos/as cidadãos/ãs. Um dos elementos fundamentais da democracia é o direito à liberdade de expressão, de opinião, de manifestação. Um ambiente social pacífico não pode ser conquistado às custas deste direito”, afirma o texto.

“Tratar manifestações assim significa um risco de retrocesso. Manifestação não é ato terrorista. Claro que têm ocorrido atos de violência que não podem acontecer, mas teria que ver todos os casos, inclusive quando a policia mata”, lembra Cândido Grzybowski, diretor do IBASE. “É péssimo que o tema seja pensado nesse contexto, diretamente relacionado à morte de um jornalista. Parece estar atendendo às pressões da mídia sobre esse caso e não levando em conta outras mortes, as ações violentas da policia”, lembra Cândido Grzybowski, diretor do IBASE.

Outra nota assinada por diversos movimentos e organizações da sociedade civil denuncia que a “violência no contexto das manifestações não é de hoje”. Segundo o texto, “contabilizam-se ao menos 18 mortes em todo o Brasil, incluídas neste número as execuções de nove moradores da Maré durante uma operação da PMERJ, com apoio da Força Nacional de Segurança, no dia 24 de junho, a partir da justificativa de ‘buscar suspeitos’ de terem realizado um arrastão durante uma manifestação em Bonsucesso”. A nota registra ainda ao menos 118 agressões a jornalistas em todo o Brasil desde junho de 2013, a maioria delas cometidas pela polícia, além de incontáveis manifestantes atingidos gravemente por balas de borracha e estilhaços de bombas de efeito moral.

“A polícia carrega no seu seio o espírito terrorista. Vem do período militar a concepção que ela aplica hoje. Continuam matando como matavam, torturando como torturavam, não mudou muito. Ela foi preparada para a repressão e continua fazendo. Quando chega a uma manifestação, chega com a mesma cultura, não sabe como tratar. Ela mostrou isso ano passado, em São Paulo, no Rio e em outros lugares. Em parte, a policia ajudou a criar o problema, porque a atuação dela não é para garantir o direito de manifestação, mas para reprimir”, alerta Cândido.

O diretor do IBASE questiona a postura da mídia perante as manifestações, em especial seu papel ao alimentar a comoção em torno da trágica morte de Santiago. “A mídia está há tempos falando em vandalismo e foi a morte de um cinegrafista que fez eles reagirem. É muito esquisita essa posição. É como se a mídia também estivesse numa escalada de violência”, afirma. “A mídia tenta pautar as manifestações. No início ela apostou que isso ia desestabilizar o governo. Quando ficou mais claro que estavam em questão direitos e não a corrupção, que era do que ela queria tratar, especificamente contra o PT, ela rapidamente muda de posição e passa a chamar os manifestantes de vândalos.”

PL ignora discussão internacional sobre terrorismo

Para Camila Marques, advogada do Centro de Referência Legal em Liberdade de Expressão e Acesso à Informação da ONG Artigo 19, o PL 499 tem problemas e imprecisões graves e não deveria ser levado adiante. “Não seria um benefício mudar alguns artigos, essa lei não deveria existir no ordenamento jurídico brasileiro. O projeto deixa espaço para criminalizar grupos que não são terroristas, mas movimentos sociais”, defende. “Em todos os artigos o PL reflete algo muito genérico, conceitos que não são muito bem definidos. Isso é um problema porque aí cabe ao juiz decidir aquele conceito. Um exemplo problemático é o conceito de ‘provocar pânico e terror’. Como definir o que é pânico? Como é provado que essas situações foram provocadas? Isso o projeto não define”, analisa.

Essas brechas abrem espaço para que a lei seja usada contra manifestações e movimentos sociais legítimos. Por exemplo, o texto caracteriza como terroristas manifestações em palcos tradicionais de reuniões populares, como estações de metrô, barragens, escolas e estádios esportivos. Em outro artigo, cria penas para o financiamento do terrorismo – abrindo espaço para que apoiadores e doadores de movimentos sociais e organizações possam ser criminalizados junto com as entidades.

Camila também ressalta artigos do projeto que se sobrepõe a legislações já existentes. “Ele traz a possibilidade de punição para ‘terrorismo contra coisas’, por exemplo. Eu questiono a necessidade desse artigo, pois já temos no Código Penal o crime contra o patrimônio”, explica. Além disso, as penas previstas são mais altas do que o Código Penal dispõe para outros crimes, novamente entrando em atrito com a legislação existente.

Para ela, a proposta ignora todo um debate internacional já consolidado sobre o que define terrorismo e como combatê-lo. “Há todo um protocolo internacional da ONU e de outras entidades que coloca as condições do que deve ser visto como terrorismo. No Brasil, não temos acumulo de discussão sobre isso. A gente vê novamente os congressistas e a comunidade envolvida a favor desse PL não estão discutindo com base nesses documentos internacionais que há tempos debatem o que é terrorismo, como deve ser uma lei a respeito disso. Entender como terrorismo essas práticas de movimentos sociais e ações na rua acontece porque nunca discutimos o que é terrorismo”, lamenta.

O debate a respeito do direito de manifestação, reacendido após as Jornadas de Junho, no ano passado, chega a um ponto crucial, alimentado por um cenário político agitado tanto pelas eleições de outubro quanto pela Copa do Mundo em junho. Para as OSCs, interessa inverter o rumo indicado por tais projetos de lei e discutir caminhos para ampliar a democracia, incluindo mudanças na cultura da polícia brasileira.

Fonte: Observatório da Sociedade Civil

Leia Mais...

Em defesa da democracia

A Abong – Organizações em Defesa de Direitos e Bens Comuns divulgou na semana passada nota pública em defesa dos direitos políticos e civis da população brasileira, colocados em xeque pelas ações violentas das polícias em manifestações e por propostas repressoras oriundas do Legislativo e Executivo federal.

“Estão querendo criminalizar o protesto. Estão querendo caracterizar manifestações como risco para a segurança dos/as cidadãos/ãs. Um dos elementos fundamentais da democracia é o direito à liberdade de expressão, de opinião, de manifestação. Um ambiente social pacífico não pode ser conquistado às custas deste direito”, destaca o texto. Leia a íntegra abaixo:

NOTA PÚBLICA – EM DEFESA DA DEMOCRACIA

Desde os protestos de junho passado e as manifestações que se seguiram, desde os episódios de violência que ocorreram em meio a algumas delas – restritos a um número mínimo de participantes -, vem se difundindo através de alguns órgãos da mídia e através do discurso de algumas autoridades a ideia de que a solução é o aumento da repressão. Desde o final do ano passado, discutem-se projetos de lei que permitam tipificar certas ações de protesto como "terrorismo", de modo a poder prender e condenar manifestantes que se "excedam". A preocupação em garantir um clima pacífico para os jogos (e os negócios) da Copa do Mundo é o pano de fundo para estas tentativas.

Para quem viveu na ditadura, ou para quem conhece um pouco da história do nosso país, parece que estão querendo ressuscitar a "Lei de Segurança Nacional". Estão querendo criminalizar o protesto. Estão querendo caracterizar manifestações como risco para a segurança dos/as cidadãos/ãs. Um dos elementos fundamentais da democracia é o direito à liberdade de expressão, de opinião, de manifestação. Um ambiente social pacífico não pode ser conquistado às custas deste direito.

Os/As cidadãos/ãs devem poder expressar suas reivindicações ou suas discordâncias, sem receio de que seu ato seja considerado um crime. E o Estado deve garantir as condições para que este direito seja exercido, assim como deve garantir segurança para a população e, portanto, impedir atos de violência. Isto deve ser feito na forma da lei e de maneira a não colocar em risco a vida das pessoas. O primeiro exemplo de respeito aos direitos deve vir do Estado, das forças de segurança. Do mesmo modo, o protesto por parte dos/as cidadãos/ãs deve ser pacífico – como foi até agora por parte de 99% dos/as manifestantes -, e a violência deve ser coibida.

O mundo não se tornou mais seguro depois do desencadeamento da "guerra ao terror" pelo governo Bush. Ao contrário, vários direitos civis foram violados e a liberdade das pessoas foi cerceada. A legislação nos Estados Unidos e em vários outros países se tornou mais repressiva, gerando um clima de tensão e de medo que muitos têm denunciado: entramos num caminho em direção a Estados "de exceção", a sociedades de controle – câmeras por toda parte, dados pessoais devassados, invasão de privacidade (de correio eletrônico, inclusive), policiamento ostensivo. Contrariamente à intenção divulgada, não ficamos mais seguros, estamos sob o olhar e a vigilância permanente do "Grande Irmão".

Não queremos isso aqui: lutamos muito para redemocratizar este país. Construímos uma Constituição Cidadã (1988) e o que desejamos é aprofundar a democracia conquistada para que ela seja efetivamente expressão da soberania popular, e falta um bom caminho para isso. Não queremos voltar atrás.

Os recentes acontecimentos, que resultaram numa tragédia lamentável – a morte do cinegrafista Santiago Ilídio Andrade -, não podem servir de pretexto para promover uma mudança em nossa legislação que a torne mais autoritária. A solução para a violência é mais democracia e não menos.

Também não podem servir para lançar uma "caça às bruxas" com acusações infundadas lançadas irresponsavelmente através de meios de comunicação. Nós temos exemplos suficientes em nossa história dos desastres que tais iniciativas podem produzir: acusações que, depois de acabar com a reputação de cidadãos/ãs, se evidenciam falsas.

E, procurando ir ao âmago da questão: por que tais manifestações? Por que tais protestos? Qual a resposta que as autoridades deram às "vozes das ruas"? Para dar um único exemplo, as planilhas de custos dos meios de transporte público foram abertas, tornadas públicas, para justificar os aumentos que foram (e estão sendo novamente) solicitados?

Antes de criminalizar manifestantes, que se procure responder às reivindicações dos/as cidadãos/ãs, que se abram canais de diálogo entre representantes e representados/as. E que se faça uma profunda reforma do nosso sistema político, para permitir que o povo seja realmente o soberano desta nação.

Diretoria Executiva da Abong – Organizações em Defesa dos Direitos e Bens Comuns

Leia Mais...

Ameaças de morte e ausência de justiça: os riscos da luta anticorrupção

Diariamente cidadãos, ativistas, jornalistas e blogueiros sofrem ameaças por testemunharem ou denunciarem casos de corrupção pelo Brasil. Pode ser na mais remota e afastada comunidade ou na maior cidade do país, os combatentes e delatores são coibidos para que não estraguem esquemas como lavagem e desvio de dinheiro, por exemplo. Embora o governo federal ofereça programas de proteção, há ainda muitos casos que permanecem obscuros e a segurança dessas pessoas segue ameaçada.

Em todo o País mais de 2 mil cidadãos estão sob ameaças de criminosos, segundo um levantamento da Revista Congresso em Foco que contabilizou os brasileiros que fazem parte de programas de proteção. Porém, esses são os dados oficiais, e certamente esse número é bem maior levando em conta os brasileiros que ainda não procuraram nenhum tipo de apoio.

Investigando e denunciando casos de corrupção, os ativistas correm riscos físicos, morais e psicológicos, e muitas vezes acabam sendo motivados a desistirem da luta contra a corrupção.

“Já sofri atentado à mão armada, agressão física, verbal e moral”, revelou o advogado, jornalista e fundador da Associação dos Amigos de Januária (ASAJAN), integrante da Rede AMARRIBO Brasil-IFC, Fábio Oliva, que atua no interior de Minas Gerais.

Contudo, Fábio não desistiu. “A preocupação com a minha própria segurança e da minha família é constante. Mas isso não nos desanima. A família está consciente e procura minimizar os riscos, não facilitando muito”, contou.  Em busca de proteção, o membro da ASAJAN procurou um programa do governo a fim de garantir a sua integridade, mas, segundo ele, o resultado foi decepcionante. “Quem acreditar que o Estado lhe garantirá segurança estará fadado a se decepcionar. Essa história de policiais lhe dando cobertura é coisa de filme, muito longe da realidade”, disse Fábio.

O governo federal dispõe de dois programas de proteção através da Secretaria dos Direitos Humanos. O Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos (PPDDH), criado em 2004, tem o objetivo de garantir a proteção de pessoas que estejam em situação de risco ou ameaça em decorrência da atuação na promoção ou defesa dos direitos humanos. Além dele há o Provita, Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, o qual tem parceria com 17 unidades da Federação. O programa foi iniciado em 1999 já atendeu cerca de 10 mil pessoas, segundo a pasta.

Contudo, segundo a Diretora de Combate à Corrupção da AMARRIBO Brasil, Lizete Verillo, os programas federais responsáveis por promover a segurança, estão aquém dos deveres de proteção e nem sempre demonstram transparência em suas ações.

O presidente do Movimento Alerta Antonina do Norte, Francisco Fernandes, que integra a Rede AMARRIBO Brasil-IFC, precisou da proteção do PPDDH. “Fui incluído no Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos e isso aumentou a minha esperança de dar continuidade ao trabalho social e resguardar a integridade de sua família”, contou. Francisco havia solicitou a inclusão no programa após sofrer diversos tipos de violência. “Foram ameaças de morte e um atentado onde fui espancado em público por um grupo chefiado por familiares do prefeito e de um vereador”.

Entretanto, Francisco afirmou que o atendimento do PPDDH não foi o que ele esperava e ainda se sente desamparado. “Existem vários outros defensores abandonados a própria sorte sem receber atendimento”, revelou o cearense que precisou mudar de município e passou a viver escondido, sem poder ir a sua cidade natal.

Ativistas de Analândia, cidade no interior de São Paulo, também passaram por momentos de tensão. De acordo com a representante da AMASA – Amigos Associados de Analândia –, que também faz parte da Rede da AMARRIBO, Liana Morisco, os criminosos agiam de várias formas. “As ameaçam vinham desde tirar o emprego de quem fosse contrário ao prefeito na época, a envenenamento de cachorros e tentativa de atropelamento, assaltos às casas dos membros da ONG, perseguições e ligações com ameaças”, contou, acrescentando que os malfeitores também utilizavam bombas para coibir o trabalho dos voluntários.

O caso foi tão grave que o vereador Evaldo José Nalin, o qual se aproximou da AMASA e começou a denunciar fraudes na prefeitura, foi assassinado a tiros, na porta de sua casa e em frente a sua família, em 2010. Segundo Liana, após a morte de Nalin o clima na cidade piorou e a tensão somente diminuiu depois que o acusado foi preso.

Contudo, a ativista confessou que até hoje há tentativas de intimidar as ações da ONG, mas agora são “camufladas”. “Ainda tentam denegrir a imagem da AMASA e dos membros. Também oferecem emprego na tentativa de calar quem defende a organização”, disse. Mesmo assim, os combatentes da AMASA não desistiram e continuam fazendo o trabalho de controle social em Analândia.

Atualmente, quando acontece algum tipo de ameaça aos membros da Rede AMARRIBO Brasil – IFC as organizações atuam em conjunto para garantir a segurança. “É importante tornar pública as ameaças, explicitar na internet e órgãos de imprensa, por exemplo, além de registrar a ocorrência. Porém, há casos em que o denunciante sequer pode ir aos órgãos policiais, pois algumas vezes a polícia é conivente com a violência, por isso a Rede acaba sendo uma ferramenta de segurança”, disse Lizete Verillo, Diretora de Combate à Corrupção da AMARRIBO.

De acordo com o membro do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) e, Luciano Santos, a violência está presente em tantos lugares que até juízes ficam sem segurança quando prolatam uma sentença. “Se no Judiciário está assim, imagine no caso dos pobres mortais cidadãos comuns”, observou.

Centros de Incidência e Assistência Legal

Para mudar esse quadro e dar maior apoio e segurança, não só para a sua Rede, mas para qualquer cidadão brasileiro, a AMARRIBO Brasil, capítulo em formação da Transparência Internacional (TI), busca trazer para o país uma das ferramentas mais bem sucedidas da TI, os Centros de Incidência e Assistência Legal (ALACs, sigla em inglês). O objetivo é garantir que os cidadãos tenham o apoio necessário para exercer seu potencial de transformação.

Todos os dias, a AMARRIBO e sua rede recebem denúncias de casos de corrupção e pedidos de ajuda. Cidadãos em todo o país tem cada vez mais se interessam pelo combate à corrupção, mas frequentemente não contam com o conhecimento ou os meios para combatê-la. Essas pessoas precisam de segurança e apoio para que suas vozes sejam ouvidas e a justiça seja feita.

Com mais de 80 centros pelo mundo, os ALACs oferecem um mecanismo simples, viável e confiável para as pessoas apresentarem queixas contra casos de corrupção, seja uma pessoa em situação vulnerável, seja um empresário.  Além de fortalecer os cidadãos, os Centros também têm um papel fundamental na identificação de pontos críticos de corrupção que requerem a ação oficial ou reformas específicas.

Atualmente, 60 países contam com os serviços dos ALACs, mecanismo que foi criado em 2003. Desde então, mais de 140 mil pessoas procuraram os Centros ao redor do mundo.

Segundo Bruno Brandão, da Transparência Internacional, o Centro de Incidência e Assistência Legal é um dos eixos estratégicos para formação do capítulo nacional da TI no Brasil. “O trabalho encontra-se na fase de formação de parcerias e adaptação do modelo ALAC para o Brasil”, disse.

O objetivo é instalar um centro primeiramente em São Paulo, o qual enfrentará os desafios da metrópole prestando assistência a uma maior variedade de tipos de casos. “Em seguida será a vez de Brasília receber um ALAC. Ele dará assistência ao denunciante de casos envolvendo os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário em nível federal”, informou Bruno.

Para Luciano o ALAC trará maior segurança e motivação aos ativistas. “Ele irá colaborar para que o cidadão possa se sentir encorajado a fazer as denuncias sem ter o receio de retaliações. Além de disponibilizar informações para que a denúncia possa ser feita corretamente, pois hoje temos muitas denúncias sem fundamento e muitos denunciantes que correm risco de morte”, disse.

Para saber mais sobre a atuação estratégica da AMARRIBO Brasil como representante da Transparência Internacional acesse: https://amarribo.org.br/pt_BR/midia/ver_noticia/300

Para apoiar o projeto de criação dos ALACs no Brasil escreva para brazil@transparency.org

Leia Mais...