Rússia: legado dos jogos olímpicos manchado por prisões

O legado dos Jogos Olímpicos de Sochi está contaminado pelas inúmeras violações de direitos humanos no período que o antecedeu e durante o evento esportivo, bem como pelo fracasso do Comitê Olímpico Internacional para enfrentar as autoridades russas quanto às prisões e espancamentos que marcaram este evento desportivo de prestígio, disse a Anistia Internacional, na véspera da cerimônia de encerramento, que aconteceu no último domingo (23/2).

"Os Jogos Olímpicos são destinados a contribuir para um mundo melhor e mais pacífico. Esta meta não foi alcançada em Sochi. A razão é simples: a repressão da Rússia continuou inabalável ao longo dos jogos, e o movimento Olímpico não conseguiu desafiar o país sede dos jogos em sua promessa de promover os direitos humanos ", afirmou Sergei Nikitin, diretor do escritório de Moscou da Anistia Internacional.

"Os assédio, detenções, prisões, acusações falsas e julgamentos injustos infligidos aos ativistas sob as luzes reluzentes de câmeras do mundo, foram uma praga para os jogos. Ele não trouxe nada de bom para quando os jogos acabarem e a mídia mundial deixar a Rússia", completa Nikitin.

A lista de violação de direitos  humanos cometidas no contexto dos Jogos Olímpicos é longa

No meio dos jogos, em 18 de Fevereiro, nove pessoas foram detidas no centro de Sochi. Entre eles estavam Nadezhda Tolokonnikova e Maria Alyokhina, integrantes do grupo punk Pussy Riot e consideradas ex-prisioneiras de Consciência pela Anistia Internacional. No dia seguinte, várias integrantes do grupo foram agredidas, chicoteadas e jogadas ao chão por homens fardados que se autodenominam Cossacks (grupo paramilitar que atua na região).

A ativista transgênero da Itália, Vladimir Luxuria, foi presa em Sochi em 17 de fevereiro por fazer a projeção de um banner do arco-íris, que dizia: 'Não há problema em ser gay'. Outros ativistas e jornalistas também foram perseguidos e alguns presos.

"Houve um período em que as prisões de ativistas e em torno de Sochi foram relatados quase diariamente. Ativistas que tentavam protestar contra a discriminação em outras partes do país, longe dos holofotes olímpicos, também foram presos”, disse.

Antes do início dos Jogos, ativistas destacaram questões de grande preocupação, que incluíam remoções forçadas para abrir espaço para a infra-estrutura olímpica, más condições de trabalho para os trabalhadores que também eram mal pagos, e a destruição de áreas de preservação ambiental. Ativistas que denunciaram estas violações foram perseguidos e presos.

Os ativistas Yevgeniy Vitishko e Igor Kharchenko, membros da ONG Ambiental Ajude o Cáucaso do Norte (Ecologicheskaya Vakhta po Severnomu Kavkazu) com base na região de Krasnodar, que sediou os Jogos Olímpicos de Sochi, foram presos em incidentes separados em 3 e 4 de Fevereiro, respectivamente. Eles foram condenados à prisão por acusações forjadas de vandalismo e resistência a ordens da polícia. Ambos estavam atrás das grades quando os visitantes de suas região nativa, Krasnodar, estavam desfrutando a cerimônia de abertura dos Jogos. Prisioneiro de consciência, Yevgeny Vitishko posteriormente foi sentenciado a três anos de prisão por atos relacionados a seu ativismo ambiental.

O grupo vinha destacando a destruição de floresta protegida e outros danos ambientais que os Jogos Olímpicos tinham trazido para sua região. Outros membros da Patrulha Ambiental foram submetidos a repetidas prisões, breves detenções, buscas pessoais, interrogatório pela polícia , e avisos não-oficiais de polícia e agentes de segurança para não irem à manifestações durante os Jogos Olímpicos de Sochi.

"O assédio da Patrulha Ambiental e a prisão de Yevgeniy foi o culminar de uma campanha direcionada para silenciar e sufocar críticas na preparação para os Jogos de Sochi ", disse Sergei Nikitin.

A Anistia Internacional pediu continuamente ao Comitê Olímpico Internacional (COI) para condenar as prisões e perseguição de ativistas ambientais em Sochi antes e durante os Jogos, para abordar as graves violações dos direitos humanos associadas à preparação dos Jogos. Assim também fizeram outras organizações de direitos humanos.

" O silêncio do COI frente às violações dos direitos humanos na Rússia tem sido ensurdecedor. Sim , os Jogos Olímpicos devem estar acima de questões políticas, mas não acima dos direitos humanos. Em vez de promover a igualdade e os direitos humanos , os membros do COI lavaram as mãos de toda a responsabilidade preferindo tomar a linha oficial que as autoridades russas lhes deram", afirmou Sergei Nikitin.

Brasil – Com o fim dos jogos de Sochi os olhos do mundo inteiro se voltam agora para o Brasil. Os gastos com a Copa do Mundo já sofreram inúmeras alterações e cada vez as cifras ficam mais altas. O megaevento no Brasil já foi criticado ter os estádios com os assentos mais caros do mundo. Além dos gastos e investimentos, as remoções forçadas têm sido o drama das famílias brasileiras desde o início das obras para a Copa do Mundo e às Olimpíadas no País. Estima-se que pelo menos 170 mil pessoas passaram ou estejam passando por despejos relacionados aos eventos, o que corresponde a quase um em cada mil brasileiros. Raquel Rolnik, relatora da ONU, declarou em entrevista para o Portal Terra que a Copa no Brasil deixará ônus, e não legado. 

Fonte: Anistia Internacional

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Grandes eventos esportivos: corrupção é gol contra!

Os grandes eventos esportivos deveriam ser celebrações de excelência e motivo de orgulho nacional, mas não tem sido bem assim. A corrupção está tomando o espaço das vitórias nas manchetes, e isso não é exclusividade do Brasil.

Deixando de lado as questões de segurança nas Olimpíadas de Inverno de Sochi 2014, os custos elevados, a falta de transparência e – como resultado disso – as alegações de corrupção é que são as notícias da vez.

O custo estimado das Olimpíadas de Inverno em Sochi foi de US$51 bilhões (cerca de R$122 bilhões), sete vezes mais do que nas últimas Olimpíadas de Inverno no Canadá, US$37 bilhões a mais que as Olimpíadas 2012 em Londres, e US$8 bilhões a mais que em Beijing 2008.

O orçamento original em Sochi era de US$12 bilhões (cerca de R$28 bilhões). De acordo com o Comitê Olímpico Internacional (COI), os custos da infraestrutura esportiva são de US$2,2 bilhões, em conjunto com a prévia dos Jogos Olímpicos. E esse foi o custo da intraestrutura não esportiva – como estradas e hotéis – que inflaram.

A Transparência Internacional Rússia está monitorando as informações que estão disponíveis publicamente sobre os jogos de Sochi. Em um pequeno relatório, a organização observou supostos casos de corrupção, a corrupção olímpica, incluindo superfaturamentos e suposta atividade criminosa.

A Olympstroy – empresa estatal russa responsável por desenvolver os Jogos – foi uma das avaliadas pela TI Rússia. No quesito transparência e medidas contra a corrupção, a empresa marcou 12 de um total de 17 pontos possíveis. No entanto, ela não tem um código de ética e não divulga relatórios de suas subsidiárias ou informações substanciais sobre os contratos públicos.

Embora várias pessoas tenham sido afastadas da empresa, nenhum caso chegou ao tribunal. O governo russo se prepara para lançar um relatório de auditoria na primavera sobre os jogos de Sochi e a TI Rússia vai analisar e comentar este relatório.

Um funcionário do Comitê Olímpico afirmou que a corrupção somou um terço do superfaturamento em Sochi. Alguns relatórios detalham supostos casos de corrupção e de conflitos de interesses.

Quem é o responsável?

Grandes eventos são de propriedade de organizações, como do Comitê Olímpico (COI) e da FIFA – órgão máximo do futebol mundial. Essas organizações precisam encontrar cidades e países dispostos a fornecer as instalações, a partir de estádios para sediar a realização dos eventos.

Quando uma cidade faz uma oferta para um evento, ela descreve como será o projeto, incluindo todos os trabalhos necessários para a construção dos estádios até a logística do transporte dos atletas para os alojamentos.

Os protestos no Brasil e os altos custos e Sochi levaram o COI e a FIFA a anunciar uma revisão de como eles escolhem uma cidade-sede ou país e quais critérios precisam ser cumpridos para entregar as obras do evento.

Novas regras

A Transparência Internacional (TI), organização que a AMARRIBO Brasil representa no país, contribuirá para esta revisão com critérios baseados nos princípios da transparência e participação das partes interessadas. A TI quer que a sociedade civil e as pessoas comuns tenham voz nesse processo. A organização também deseja que medidas anticorrupção adequadas sejam presentes para impedir a corrupção em todas as fases do processo. O dinheiro para realizar esses eventos vem dos contribuintes; qualquer desvio afeta as populações locais.

As preocupações da TI são:

  1. Votação para sediar eventos: a FIFA foi criticada pela falta de transparência quando atribuiu a Copa do Mundo de 2018 para a Rússia e para o Qatar, em 2022.
  2. Maior atenção as questões relacionadas a terra, direito de propriedade e respeito ao meio ambiente: tanto em Sochi 2014 quanto na Copa 2014 e nas Olimpíadas de 2016 no Brasil, houveram graves violações de direitos humanos relacionados a essa questão. 

A Transparência Internacional publicará os critérios propostos para a uma consulta pública. A ideia é incentivar o COI e a FIFA para que façam o mesmo, garantindo o envolvimento sistemático das partes interessadas na revisão da licitação e nos critérios de hospedagem. Os critérios também devem levar em conta as novas orientações para a hospitalidade e patrocínio publicado pelo Pacto Global das Nações Unidas.

Três maneiras de melhorar grandes eventos:

Maior participação dos interessados: a sociedade civil, organizações internacionais e nacionais, e os cidadãos devem ter uma maior influência na forma como os principais eventos são atribuídos e desenvolvidos do início ao fim.

Reforçar critérios para a licitação e concessão: critérios de licitação devem incluir padrões mínimos de direitos fundamentais, incluindo os direitos humanos, os direitos dos trabalhadores, e as proteções ambientais. Os concorrentes também devem comprometer-se a padrões éticos.

Cumprindo as regras: é necessário maiores sanções e incentivos para obrigar os licitantes a cumprirem as promessas assim como constam nas propostas originais.

Copa do Mundo no Brasil

No Brasil, recentemente, milhares de manifestantes foram às ruas novamente para protestar contra os custos da Copa do Mundo de 2014, que começará em junho. Os brasileiros querem que o dinheiro público seja gasto em educação e saúde, não estádios de futebol.

Os gastos com a Copa do Mundo já sofreram inúmeras alterações e cada vez as cifras ficam mais altas. De acordo com informações do Ministério do Esporte, publicadas em novembro, o mundial terá um custo de R$ 25,6 bilhões. A previsão é que o montante seja gasto, além das construções dos estádios milionários, em mobilidade urbana, portos e aeroportos, em turismo, nas telecomunicações e em segurança.

O megaevento no Brasil já foi criticado ter os estádios com os assentos mais caros do mundo. Além disso, alguns hotéis, que recebem financiamento do BNDES para o Mundial, não ficarão prontos em tempo.

Nesta semana foi divulgada uma pesquisa, do MDA Pesquisa com a Confederação Nacional do Transporte, que constatou que a maioria dos entrevistados estão insatisfeitos com a realização do Mundial no País. 4 em cada 5 brasileiros acreditam que os investimentos nos estádios deveriam ser utilizados em outras áreas. Somente 13% opinaram dizendo que os valores gastos e empenhados paro evento foram adequados. Além disso, 85% dos entrevistados acham que durante a Copa do Mundo haverá manifestações. Entretanto, somente 12% dos participantes da pesquisa informaram que irão protestar nas ruas no período da Copa.

Há pouco mais de cem dias para o início dos jogos, os estádios ainda não formam concluídos, assim como as obras de mobilidade urbana e ampliação dos aeroportos.  Por pouco Curitiba não deixou de ser uma das cidades-sede. Os atrasos nas obras do estádio levaram a FIFA a dar um ultimato aos responsáveis pela organização da Copa na cidade em 21 de janeiro. Valcke ameaçou tirar a Copa do município caso as obras não avançassem de forma significativa. Hoje, a Fifa anunciou que as obras da Arena da Baixada, palco de quatro jogos no Mundial, atingiram um nível satisfatório e entenderam que o poder público deu garantias suficientes de que há dinheiro para terminar a reforma.

Além dos gastos e investimentos, as remoções forçadas têm sido o grande drama das famílias brasileiras desde o início das obras para a Copa do Mundo e às Olimpíadas no País. Estima-se que pelo menos 170 mil pessoas passaram ou estejam passando por despejos relacionados aos eventos, o que corresponde a quase um em cada mil brasileiros.

Fiscalização e controle social

Por esses motivos a fiscalização e cobrança dos cidadãos é extremamente importante para que os eventos deixem algum legado para o Brasil. A corrupção e a violação de direitos humanos não podem ser admitidas.

Para saber mais sobre o grande evento, é possível buscar informações junto ao Portal da Copa, criado pelo governo brasileiro. No site é possível encontrar dados sobre o andamento das obras nos estádios, os preparativos para a Copa, assim como a Matriz de Responsabilidades. Além disso, vale a pena acompanhar o Projeto Jogos Limpos, iniciativa do Instituto Ethos, que avalia o nível de transparência das cidades-sede e ferramentas para ações coletivas de monitoramento e controle social dos cidadãos sobre os investimentos destinados para a Copa do Mundo, Olimpíada e Paraolimpíada no Brasil.

Informações para imprensa

Nicole Verillo – nicoleverillo@amarribo.org.br

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