Regulamentação da Lei Anticorrupção deve melhorar ambiente de negócios

Incentivar a estruturação de sistemas de integridade corporativa e criar parâmetros para que os gestores públicos autorizados possam aplicar sanções adequadas a cada caso de corrupção identificado dentro das empresas privadas. Estas são as diretrizes do decreto regulamentador da Lei 12.486, a chamada Lei Anticorrupção, que está em fase final de elaboração na Controladoria-Geral da União (CGU).

A informação foi prestada pelo secretário de Prevenção da Corrupção e Informações Estratégicas da CGU, Sérgio Seabra, no Seminário Anual do Pacto pela Integridade e contra a Corrupção, promovido em São Paulo pelo Instituto Ethos, em parceria com a CGU, a Rede Brasileira do Pacto Global, a Patri Políticas Públicas, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (Ibrademp), a Articulação Brasileira contra a Corrupção e a Impunidade (Abracci), a Amarribo Brasil e o Uniethos, realizado no dia 3 de dezembro.

A tramitação do decreto dentro do governo e a aproximação da data de vigência da lei, dia 29 de janeiro de 2014, levaram o gerente executivo de Políticas Públicas do Instituto Ethos, Caio Magri, a exortar as empresas a participar do processo de regulamentação democraticamente estabelecido pela CGU. “Participação agora é fundamental, para não truncar o processo”, disse ele, ao lembrar que o Ethos coordena o processo de diálogo, recolhendo questões a partir dos programas de compliance das empresas para contribuir no aperfeiçoamento da regulamentação.

Na mesma mesa de debate sobre “Impactos da Nova Lei 12.846 em Sistemas de Compliance”, o sócio e CEO da Patri Políticas Públicas, Eduardo Carlos Ricardo, afirmou que essa participação faz parte do processo, porque “não existe lei perfeita e não caminhar em função disso não é produtivo”. Segundo ele, “já é um grande progresso aprovar uma lei dessa natureza em meio a 23 mil proposições que estão em discussão no Congresso”, de acordo com levantamento da Patri. O projeto de lei encaminhado pelo Executivo ao Legislativo em 2010 foi votado e promulgado no início de agosto deste ano, como parte da agenda positiva estabelecida pelo governo em resposta às manifestações populares de junho, na opinião de Ricardo.

Responsabilidade objetiva

O deputado federal Carlos Zaratini (PT/SP) assinalou que o projeto de lei, do qual foi relator, tem como eixo o conceito da “responsabilidade objetiva”, que prevê “punição da empresa independentemente da comprovação de o ato de corrupção ter ou não ocorrido com conhecimento da direção”. Ele previu que com a lei “vamos ter punições efetivas”, em razão da autorização para que os gestores públicos dos três Poderes, nas três esferas (municipal, estadual e federal), apliquem multas “rapidamente, a partir da instauração de procedimento administrativo”, afastando a possibilidade de as empresas desqualificarem o processo no Judiciário.

“O instrumento de responsabilização administrativa é muito elogiado internacionalmente”, contou o coordenador da Comissão Anticorrupção do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial, Carlos Ayres, que coordenou esse debate. Ele recolheu essa impressão na 5ª Conferência das Partes Signatárias da Convenção da ONU de Combate à Corrupção, encerrada na semana passada. “Além disso, tem contribuído para a melhoria da imagem do Brasil”, disse Ayres, “o fato de que 1.266 pessoas foram presas por questões relativas a corrupção em 269 operações da Polícia Federal em 2012”.

A implementação de práticas anticorrupção no nível global foi abordada também na mesa “Avanços e Desafios para a Transparência Corporativa”. “É importante conectar países emergentes para troca de experiências anticorrupção”, disse Markus Beck, que atua com essa perspectiva como coordenador do Programa de Parcerias Globais em Mercados Emergentes da GIZ, agência de cooperação internacional da Alemanha. “A corrupção não para nas fronteiras nacionais, ou numa região”, justificou.

“Credibilidade, reputação e sustentabilidade são resultados da aplicação de um programa de compliance”, pontuou o diretor da Embraer, Pyter Stradioto. Esses programas dentro das empresas visam garantir o cumprimento de regulamentos internos e externos de aderência voluntária ou impostos às atividades da organização. “Compliance é uma forma de instrumentalizar o código de ética e conduta da companhia; não é algo que se copia e cola de alguém ou de alguma empresa”, explicou.

Por isso mesmo, “as companhias devem resistir à pressão para a implantação apressada de códigos de ética e sistemas de governança”. A sugestão é de Josmar Verillo, vice-presidente do Conselho da Amarribo Brasil, ONG que desde 1999 atua no combate a práticas de corrupção. “Por pressão não funciona. A construção do código de ética deve se basear em valores efetivamente assumidos pela empresa. A pressão pode desmoralizar a iniciativa, porque os próprios executivos acabam violando os preceitos para atender a situações imediatas”, disse Verillo, que tem assento no conselho de administração de várias companhias.

Governança e ética

“Governança corporativa é indissociável de ética e transparência”, defendeu o professor Lelio Lauretti, do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). “O objetivo do código de conduta é elevar o nível de transparência na cultura organizacional”, acrescentou, ao identificar a necessidade de aproveitar o marco regulatório anticorrupção para exigir mais prestação de contas tanto dos administradores públicos quanto das empresas.

A defesa do professor Lauretti, um dos fundadores do IBGC, confirmou a avaliação apresentada na abertura do Seminário Anual do Pacto pela Integridade e contra a Corrupção pelo presidente do Instituto Ethos, Jorge Abrahão. Entre outras ações do Pacto no período, ele destacou que foi realizado um intenso acompanhamento das iniciativas das empresas participantes por meio de um questionário de monitoramento, um dos requisitos para sua permanência como signatárias. E isso culminou na exclusão de 133 empresas que não atenderam essa exigência.  “Hoje a gente pode dizer que o Pacto tem 237 empresas fortemente qualificadas e comprometidas com todo o processo.”

Abrahão destacou também “o papel da mobilização da sociedade civil na luta pela transparência e contra a corrupção”. Disse que “este ano foi ótimo, de conquistas importantes, como as leis da Ficha Limpa, de Acesso à Informação e de Responsabilização Civil”. Agora, segundo ele, “o desafio é fazer uma regulamentação forte da Lei Anticorrupção”, que vai fortalecer “o processo de construção de um ambiente de negócios com maior integridade e menos corrupção no Brasil”.

O encontro contou com o apoio das empresas Alstom, Banco do Brasil, Infraero e Shell, patrocinadoras do Grupo de Trabalho do Pacto pela Integridade, além de Alcoa, CPFL Energia, Natura, Vale e Walmart, parceiras institucionais do Ethos.

Fonte: Sávio de Tarso/Instituto Ethos

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Corrupção vira ônus para empresas

A entrada em vigor em fevereiro da nova lei anticorrupção brasileira, que prevê pesadas multas a companhias envolvidas em corrupção, foi o incentivo financeiro que faltava para que os empresários busquem criar e fortalecer processos de controle interno. "As empresas estão percebendo que medidas de transparência agregam valor de mercado. Se uma empresa não tem processos sólidos, ela já entra prejudicada na negociação", disse Carlos Peres, sócio da Price WaterHouse & Coopers Brasil, em seminário em Curitiba.

Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná, Edison Campagnolo, – que promoveu fórum sobre o tema da transparência – a corrupção é um ônus financeiro para as empresas que será ainda mais facilmente percebido com a nova lei. "Essa é uma questão que prejudica e muito a competitividade da indústria. A sociedade paga caro por uma situação que se arrasta há muito tempo", afirma Campagnolo".

Sancionada em agosto sob a pressão dos protestos, a nova lei prevê que empresas pegas em atos ilícitos contra a administração públicas sejam punidas com multas de até 20% do faturamento, proibidas de fazer contratos com o governo e até mesmo extintas.

Tais punições, porém, poderão ser abrandadas caso as companhias tenham mecanismos internos de auditorias e de incentivos a denúncias, por isso a corrida agora para criar departamentos de controle e códigos de condutas.

O diretor-presidente da Ong Amarribo (que atua na área de transparência), Josmar Verillo, disse que acompanha no momento a implantação de seis códigos de conduta de empresas.

"Dá muito trabalho ser transparente, é um aprendizado, você tem que mudar toda a empresa e responder a questionamentos. Mas é algo que passa a fazer parte da cultura da empresa", diz.

Apesar de a adoção de códigos de conduta e a implementação de procedimentos de auditoria não garantirem que uma empresa não será envolvida em corrupção, Peres afirma que mecanismos de controle interno garantem de "forma muito relevante" que a direção da empresa se inteire de casos.

Na Braskem, por exemplo, sistemas de compras e pagamentos a fornecedores são informatizados e qualquer operação fora do normal é automaticamente reportada ao departamento de compliance.

"Um sistema de compliance é importante para mitigar riscos e proteger os funcionários. O melhor patrocínio que a alta administração pode dar é a tolerância zero", disse a chefe de segurança empresarial da Braskem, Olga Pontes.

Para a professora da Universidade de Toronto, Mariana Prado, a nova lei muda o foco da discussão. Se até agora a corrupção era vista como um ato político, a lei aumenta a punição ao corruptor.

"A única lei que faltava era sobre responsabilidade objetiva das empresas", Mariana "Agora o Brasil tem tudo para combater a corrupção". Mariana alerta que a demora no julgamento nos processos pelo judiciário e o excesso de formalismo na aceitação de provas serão dificultadores na aplicação da lei. "Discute-se agora as reformas judiciais necessárias para que a lei seja melhor aplicada", conclui.

Dados da Unitar (Instituto para Treinamento e Pesquisa das Nações Unidas) mostram que a corrupção custa ao Brasil R$ 85 bilhões por ano – o país ocupa o 69º lugar no ranking de maior percepção da corrupção, da Transparência Internacional, com 174 países.

De acordo com a chefe do setor de Transparência e Anticorrupção do Pacto Global das Nações Unidas, Olajobi Makinwa, lidar com a corrupção aumenta 10% o custo de produção das empresas.

Para Olajabi, é essencial que as empresas atuem em conjunto para "igualar o jogo" e dificultar a ação de agentes públicos corruptos. "Empresas têm poder, têm dinheiro e têm influência para lutar contra a corrupção. Precisamos convencer os governos de que eles precisam implementar e fazer cumprir as leis totalmente para que as empresas também sejam protegidas", completa.

Fonte: Lorenna Rodrigues/Valor Econômico

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