Copa do Mundo: o chute inicial foi dado pela sociedade civil

O Brasil está no centro das atenções de todo o mundo com a Copa do Mundo 2014 que começa no próximo dia 12 de junho. Porém, as manchetes diárias não falam apenas sobre futebol e nunca antes os brasileiros estiveram tão apáticos à Copa do Mundo, apesar dela ser na nossa casa, o País do futebol.

Em 2007, quando o país foi indicado para sediar a Copa, surgiu uma oportunidade e um desafio. Não houve, mas se houvesse uma consulta pública provavelmente os brasileiros teriam votado a favor de receber o Mundial. Há sete anos esperava-se que o país soubesse aproveitar a oportunidade que o evento representa e trouxesse um legado para sua população. Hoje o cenário é outro.

Segundo os últimos dados apresentados pelo governo federal, a Copa do Mundo no Brasil custará cerca de R$28 bilhões, quase dez vezes mais do que o previsto quando o país foi eleito como sede do Mundial, e a previsão é que os investimentos alcancem R$33 bilhões. A conta pode ser maior ainda se consideradas as obras fora da Matriz da Copa e a renúncia fiscal cedida à FIFA. Além disso, a proposta inicial era que os custos seriam bancados em sua maioria pela iniciativa privada, o que não ocorreu, sendo que a maioria desse valor saiu dos cofres públicos. De acordo com o Ministério dos Esportes, o país vai custear 85,5% das obras relacionadas ao evento, com dinheiro dos governos federal, estaduais e municipais.

Apesar dos esforços da mídia, não vemos todas as ruas pintadas de verde e amarelo, nem casas e carros com bandeiras do Brasil, como vimos em outras edições da Copa. Estamos mais tímidos, mais revoltados e mais críticos. O sentimento é diferente e a população, de forma geral, não está satisfeita. Apesar de prontos para torcer pela seleção brasileira, a mensagem que a população deixa é clara: não concordamos com a forma como foi organizada a Copa do Mundo no Brasil.

Essa apatia demonstra que faltaram transparência e integridade nesse processo. Há sete anos os brasileiros desconheciam as exigências antidemocráticas da FIFA. Ninguém esperava as remoções arbitrárias e violentas de dezenas de milhares de famílias. Esperava-se o cumprimento de todas as obras de infraestrutura necessárias. Esperava-se um processo mais participativo e transparente, com maior controle sobre os gastos. Esperava-se um legado. Mesmo com a estrutura dos Comitês Populares e outras tentativas de mobilização da sociedade, ficou difícil para o cidadão construir um marco seguro de informações. A guerra de informações sobre o uso de recursos públicos, as remoções forçadas, os modelos de contratação, a isenção de impostos a FIFA e tantas outras questões confundiram quem queria entender. Houve dificuldade em entender quais eram as ações e obras da Copa e quais só foram relacionadas para aproveitar a oportunidade. Faltou informação clara e compreensível, faltaram fontes confiáveis, faltou transparência no processo de decisão e construção do Mundial. Faltaram esforços na tentativa de cumprir prazos e deixar transparente o processo de construção da Copa do Mundo no Brasil. Não viemos bem até aqui.

Na justificativa de se terminar as obras da Copa em tempo foi criado o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), que prometeu muito e não cumpriu. Nenhuma obra foi concluída com êxito e 100% dentro do prazo e do orçamento previsto. Faltaram projetos básicos e executivos de qualidade e aditivos foram feitos e refeitos e refeitos. O RDC provou ser um modelo que representa um canal grave para permitir desvios e que não foi bem sucedido. E apesar dos alertas e críticas vindas do Ministério Público, OAB e de toda a sociedade, o Congresso tentou, por intermédio da MP 630/13, ampliar o uso do regime para todas as obras públicas do país. No dia 20 de maio, no entanto, o Senado rejeitou a proposta.

Em relação à transparência ativa, aquela divulgada nos portais, mesmo com a iniciativa do Portal da Transaprência da Copa 2014, muitas informações só vieram através da cobrança da sociedade civil, construindo um legado da publicação das informações. Assim, ao falarmos em transparência, a sociedade civil soube se preparar muito melhor para tentar contribuir com essa agenda e não deixar a oportunidade apresentada pela Copa do Mundo passar em branco. Iniciativas vindas da sociedade civil, como o ‘Projeto Jogos Limpos Dentro e Fora dos Estádios’, do Instituto Ethos, souberam reunir a temática esportiva, em especial o futebol, que é uma paixão brasileira e vetor de fortalecimento da unidade da nação, com a luta anticorrupção.

O Projeto Jogos Limpos Dentro e Fora dos Estádios veio para estimular a transparência, a integridade e o controle social. Através de indicadores se mensurou o nível de transparência nas cidades e estados-sedes da Copa do Mundo, estimulando uma construção coletiva para melhorar a transparência. O controle social gerou uma competição positiva entre as cidades avaliadas. A melhora das avaliações de um ano para o outro demonstram que a estratégia do projeto é acertada e pode contribuir muito para melhorar as políticas públicas do tema. É uma iniciativa pioneira, não houve uma iniciativa como essa na Copa da Alemanha ou na da África do Sul.

A execução do projeto demonstrou que mesmo com a divulgação dos números e criação dos portais de transparência, nem sempre as informações chegaram aos cidadãos de forma clara e precisa. De outro lado, o cidadão não está preparado para entender e exercer o controle social dos gastos públicos. Os portais da transparência ainda precisam evoluir para que a informação não só chegue ao cidadão, mas também seja compreendida. A transparência e a melhoria dos portais é um legado provocado pela sociedade civil. Hoje, todos, ou a maioria, dos Estados e cidades-sede estão sendo forçados por pressão popular a prestar contas.

E como legado do projeto, criado pela oportunidade da Copa do Mundo, e assim como um legado também do Mundial, foi criado o ‘Projeto Cidade Transparente’, com os mesmos objetivos dos Jogos Limpos, mas com foco na gestão municipal para além da Copa do Mundo. O projeto, ainda em fase de testes, deve sair das capitais e avaliar o nível de transparência de cerca de 50 municípios. Assim, através do Cidade Transparente, o Projeto Jogos Limpos invoca a sociedade civil a não deixar a iniciativa e dar continuidade a ela. Esse é um legado.

Ao lado da transparência, a sociedade também saiu em defesa do direito à liberdade de expressão e manifestação pacífica durante a Copa do Mundo. A Anistia Internacional lançou mundialmente a campanha “Brasil, chega de bola fora”. Manifestações que ocorreram no País em 2013 levaram membros do Congresso Nacional a colocar em pauta projetos de lei que podem ser usados para criminalizar manifestantes e restringir o direito à liberdade de expressão e manifestação pacífica. O recado é claro: não aceitaremos mais violações de direitos humanos em nome do Mundial. Os brasileiros têm o direito e o dever de protestar.

Com esse cenário complexo que se desenvolveu desde 2007, a AMARRIBO Brasil espera que a Copa do Mundo ocorra de forma tranquila e que, independente do resultado, a sociedade saia campeã. O crescimento do processo de reflexão e crítica por parte da população e a ocupação dos canais de participação e manifestação não podem ser deixado de lado após o apito final.

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Ethos lança Indicadores de Transparência dos Estados sobre investimentos na Copa

A transparência nas contas dos governos estaduais para a realização da Copa do Mundo 2014 no Brasil foi tema do debate “Balanço da Copa 2014: Como Está Esse Jogo?”, promovido pelo Instituto Ethos na sede da OAB-RJ. Por meio do lançamento dos Indicadores de Transparência dos Estados, Jorge Abrahão, diretor-presidente do Instituto Ethos, ressaltou a importância de uma agenda de integridade e transparência, em relação direta com o combate à corrupção, uma questão essencial para sociedade.

De acordo com Abrahão, o descrédito nesses processos leva a conflitos e insatisfação. No Brasil, o tema tem avançado e houve marcos importantes, como a criação da Controladoria-Geral da União (CGU) e a Lei Anticorrupção Empresarial. A promulgação de um conjunto de leis mudou o padrão de relação de transparência do governo com a sociedade civil.

“O Projeto Jogos Limpos Dentro e Fora dos Estádios vem para estimular a transparência, a integridade e o controle social. É importante para avançarmos no combate à corrupção. Aliás, somos pioneiros na iniciativa, pois não houve isso na Copa da Alemanha ou na da África do Sul. Temos a expectativa de conseguir levar esse trabalho para outros grandes eventos, como os Jogos Olímpicos e a Copa na Rússia e no Catar”, afirmou Abrahão, ressaltando que o programa envolve o setor público, empresas, a sociedade civil e trabalhadores.

Nicole Verillo, diretora da Amarribo Brasil, anunciou, no evento, a criação da Cidade Transparente, com os mesmos objetivos dos Jogos Limpos, mas com foco na gestão além da Copa do Mundo. O projeto, ainda em fase de testes, deve sair das capitais e avaliar cerca de 50 municípios. A meta é lançá-lo em maio de 2015, próximo aos três anos da Lei de Acesso à Informação (LAI).

“Pegar um esporte de apelo nacional como o futebol para levantar questões como a transparência nas contas públicas e o combate à corrupção é muito oportuno. O projeto Jogos Limpos invoca a sociedade civil a não deixar a iniciativa e dar continuidade a ela. Essa é a primeira percepção de legado”, conclui Nicole.

Resultado dos Indicadores de Transparência dos Estados

A pesquisa, que avalia a quantidade e a qualidade das informações prestadas pelos governos dos Estados que sediarão as partidas da Copa 2014, apontou melhora. A segunda edição dos Indicadores de Transparência dos Estados manteve o Nordeste como a região mais bem avaliada. Pernambuco, que tinha sido o segundo colocado na primeira edição dos Indicadores, assumiu a liderança nesta rodada, com 70,16 pontos, em uma escala que vai até cem. A seguir, vem o Ceará, que caiu para o segundo lugar, com 68,55. Ambos foram classificados com nível de transparência “Alto”.

Cinco estados foram classificados com nível de transparência “Médio”: Paraná, com 59,1 pontos; Bahia, com 54,83; São Paulo, com 51,94; Minas Gerais, com 50,26; e Mato Grosso, com 47,14.

Permaneceram no nível “Baixo”: Rio de Janeiro (37,68); Rio Grande do Sul (36,71); e Rio Grande do Norte (22,25). Um destaque negativo foi o Amazonas, único Estado com o nível “Muito Baixo”, tendo somado apenas 18,88 pontos. Mesmo assim, sua pontuação melhorou em relação à primeira edição. Fato observado também nos demais Estados, exceto em Minas Gerais. Mesmo mantendo o nível de transparência “Médio”, Minas caiu 9,06 pontos. O motivo dessa queda está diretamente relacionado ao fechamento da Secretaria Extraordinária para a Copa 2014 no Estado. A página da Secopa disponibilizava alguns documentos em 2013, que neste ano deixaram de ser públicos para a população.

A nota do índice é composta por 90 perguntas e embasada no conjunto de leis que avaliam o nível de transparência em duas dimensões: “Informação” e “Participação”. As solicitações foram feitas aos governos em janeiro e fevereiro deste ano.

Já São Paulo teve o maior crescimento: saltou de 24,52 pontos para 51,94. O aumento da nota se deu pela criação e estruturação de uma Ouvidoria-Geral para o governo paulista.

Abrahão lembrou o caso de Brasília, que, avaliada nos Indicadores Municipais, tornou-se um case. Na primeira edição, não havia portal específico da Copa e as informações relativas aos gastos para o evento estavam dispersas.

Mauro Noletto, secretário de Controle do Distrito Federal, também presente, explicou que o processo envolveu uma decisão política de abrir todos os canais para não deixar nenhum questionamento sem resposta. “Orgulha-nos saber que o Ethos nos toma como referência para o aprofundamento de sua avaliação anual. Foi criado um portal de transparência especificamente para a Copa, uma solicitação direta do governador. A transparência já é um legado. É inegável que, hoje, todos, ou a maioria, dos Estados e cidades-sede estão sendo forçados por pressão popular a prestar contas.”

Para Sérgio Nogueira Seabra, secretário de Transparência e Prevenção da Corrupção da CGU, o combate à corrupção não se faz sozinho. “Há tempos inserimos isso na agenda, somos a agência anticorrupção do governo, mas apenas um ator nessa luta que nunca termina. Estou plenamente convencido de que, para enfrentar a corrupção, precisamos de forte empenho e participação do governo, da sociedade civil organizada e das empresas, que também desempenham papel importante”, complementou.

Ainda de acordo com o secretário, três estádios foram auditados pela CGU: o Maracanã (Rio de Janeiro), a Arena da Amazônia (Manaus) e a Arena Pantanal (Cuiabá). Nos investimentos previstos de R$ 2 bilhões, foram encontrados orçamentos superestimados, sobrepreço, e superdimensionamento da quantidade de serviços e produtos.

Outra participante foi Sílvia Gonçalves, assessora de Políticas Públicas da ONG de Atletas pelo Brasil, entidade parceira do Ethos. Ela defendeu transparência nas contas para receber recursos públicos, o que não acontecia nas atividades esportivas.

Lino S. Gaviolli, consultor de Compliance da Siemens, encerrou o primeiro painel lembrando que a corrupção não é nova e que os movimentos populares são excelentes, pois mostram que a sociedade quer melhores condições para o país: “Faltam três semanas para a Copa e a luta pela integridade e transparência está presente nas discussões da sociedade!”.

Fonte: Instituto Ethos – Produzido pela CDN para o Instituto Ethos.

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Ethos e AMARRIBO Brasil assinam termo de cooperação para dar continuidade aos Indicadores de Transparência após a Copa 2014

O presidente da AMARRIBO Brasil, Leo Torresan, e o Diretor Executivo do Instituto Ethos, Caio Magri, assinaram na tarde desta terça-feira (6/5) um termo de cooperação para a adaptação dos Indicadores de Transparência, desenvolvido pelo Ethos para avaliar as cidades-sede da Copa de 2014.

A intenção é ampliar a avaliação em relação aos temas avaliados, não se restringindo apenas aos investimentos de um evento, e no número de cidades avaliadas. “O número total de prefeituras em que os indicadores serão aplicados ainda não está definido, mas com certeza será bem maior do que doze”, explicou Caio Magri.

A assinatura desse documento oficializa a parceria que já vinha debatendo desde 2012 a garantia da continuidade dessa ferramenta desenvolvida pelo projeto Jogos Limpos para além da Copa.

O Indicadores de Transparência foram criados no âmbito projeto Jogos Limpos Dentro e Fora dos Estádios tanto com uma forma de avaliar objetivamente o nível de transparência das cidades-sede do mundial, como para auxiliar aos governantes servindo como uma lista de tarefas que eles precisam cumprir.

Já foram realizadas duas avaliações das cidades-sede e uma dos governos estaduais que receberão jogos da Copa. Na avaliação de Magri, a melhora da avaliação das cidades-sede entre a primeira aplicação, divulgada em 2012, e a último, divulgada em 2013, mostra que a “estratégia por trás dos indicadores é acertada e pode contribuir para melhorar as polícias públicas no tema”.

No próximo dia 22 de maio, durante o seminário “Balanço da Copa 2014: Como está esse jogo?”, o Instituto Ethos divulgará uma nova avaliação dos governos dos Estados que receberão jogos da Copa. Essa era a última rodada de aplicação dos indicadores prevista dentro do projeto Jogos Limpos.

O evento será realizado na sede da OAB-RJ e pretende fazer um avaliação de como foi a organização da Copa do Mundo no Brasil em relação à transparência, direitos humanos e meio ambiente.

Cidade Transparente

Organizações presentes na reunião sobre o projeto Cidade Transparente.

Segundo os representantes das entidades, o planejamento é divulgar a primeira avaliação dessa nova fase dos Indicadores de Transparência Municipal entre abril e maio de 2015. “Essa será uma das atividades do projeto que estamos chamando de Cidade Transparente”, explicou Leo Torresan.

A ideia é que organizações que trabalham com combate a corrupção e transparência dos dados públicos, como as integrantes da rede da Articulação Brasileira de Combate à Corrupção e à Impunidade (Abracci) e da Rede AMARRIBO Brasil-IFC, apliquem os indicadores nas suas cidades. “Acreditamos que isso possa potencializar as atividades de várias organizações locais”, avaliou Caio Magri.

“Elevar o nível de transparência nos municípios brasileiros é fundamental não só para o combate, como principalmente, para a prevenção da corrupção e também para o estímulo ao controle social e a participação cidadã”, disse Torresan.

Para auxiliar neste trabalho de organização da coleta e análise de dados, Ethos e AMARRIBO Brasil estão convidando várias entidades para participar de um grupo coordenação do projeto. Também na tarde desta terça-feira, antes da assinatura do termo de compromisso foi realizada uma reunião de apresentação do projeto para cerca de 10 entidades que podem vir a integrar esse grupo, entre elas: ABRACCI, Artigo 19, MCCE, Observatório Social do Brasil, OKFN Brasil – Rede pelo Conhecimento Livre, Rede Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis, Transparência Hacker e W3C.

“Acreditamos que essa ação pode se tornar em uma das principais referências para políticas públicas de transparência no país, e até internacionalmente”, prevê Magri.

Informações: Instituto Ethos

 

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