História
Ribeirão Bonito, como muitas cidades do interior paulista, viveu tempos áureos, em que o desenvolvimento econômico proporcionava uma boa qualidade de vida para seus habitantes e um convívio comunitário relativamente harmonioso. Quando a atividade agrícola representada pelas culturas tradicionais da região, começou a perder poder aquisitivo, muitas famílias perderam o seu meio de subsistência e migraram para as áreas urbanas. O deslocamento da população prejudicou a qualidade de serviços como saúde, educação, moradia, saneamento básico, e sobrecarregou a infraestrutura da cidade. Esse processo transcorreu em um período de aproximadamente trinta anos, entre os anos setenta e a virada do século.
Ao ver a deterioração da sua cidade natal, atribuída a uma falta crônica de verbas públicas, um grupo de cidadãos começou a pesquisar alternativas para recuperar Ribeirão Bonito. Nesta época, boatos já indicavam a existência de corrupção na administração pública, mas não haviam evidências para comprovar as suspeitas.
Em meados de 1999, um grupo de amigos, incluindo alguns profissionais de sucesso que haviam saído ainda jovens de Ribeirão Bonito e que vislumbravam uma forma de contribuir para com a cidade, procuraram tornar esse desejo em realidade. Nesta mesma época, o Padre João Francisco Trovilho Morales convocou a população para restaurar o Morro Bom Jesus, um dos pontos mais bonitos da cidade, onde se encontra a Capela de Nossa Senhora Aparecida. Já na primeira reunião, esse grupo mencionou a necessidade de participar mais de perto da administração da cidade, e que o poder público deveria prestar contas da razão da falta crônica de recursos.
Na reinauguração do Morro Bom Jesus, surgiu a idéia de criar a Associação de Amigos de Ribeirão Bonito – AMARRIBO, uma organização não governamental cuja missão seria promover o desenvolvimento humano no município, criando instrumentos para a promoção e a qualidade de vida das famílias da região e supervisionando a administração pública.Após algumas reuniões preparatórias, AMARRIBO foi oficialmente fundada em 14 de novembro de 1999. Seu primeiro presidente foi José Paulo Lucato. A partir de então, a AMARRIBO promove o Encontro Anual dos Filhos e Amigos de Ribeirão Bonito, na última semana de julho, para aproximar as pessoas que moram ou que tenham afinidade pela cidade. Os administradores públicos da época não demonstraram interesse de participar da AMARRIBO e compareceram apenas à primeira reunião da entidade. Com a eleição de um novo prefeito em 2000, o distanciamento aumentou ainda mais.
Em 2000, forma-se o Conselho de Administração, sob a presidência de Antoninho Marmo Trevisan. A criação do Conselho foi uma resposta a tentativa de enfraquecer o trabalho da organização. Hoje, é de conhecimento público que pessoas ligadas ao esquema de corrupção haviam se infiltrado na AMARRIBO com objetivo de conhecer previamente suas estratégias e sabotar suas atividades.
A AMARRIBO convidou várias vezes o então prefeito para discutir projetos para o futuro da cidade, mas ele sempre se esquivava dos debates. Em uma ocasião, mandou seu irmão no seu lugar. Esse representante cinicamente sugeriu à entidade obras de infra-estrutura que claramente estavam fora de seu objetivo e alcance, como asfalto para as ruas. O clima na cidade piorava. As desconfianças se agravaram quando a família do prefeito eleito, que toda a cidade sabia estar enfrentando dificuldades financeiras, passou a ostentar sinais de riqueza. Antes mesmo da posse, prefeito e parentes passaram a circular com carros novos e fazer viagens internacionais. Além disso, adquiriram uma área ao lado de sua residência e iniciaram uma nova construção. A maioria da população, acostumada com desmandos dos administradores públicos, resignou-se.
Após a posse, o prefeito sinalizou publicamente que iria hostilizar a AMARRIBO. A direção da organização decidiu enfrentar a oposição ainda que o poder público representasse um grande oponente, especialmente em uma cidade do interior. Logo chegaram as primeiras denúncias, que foram analisadas com cautela. Novas evidências foram sendo reveladas durante as investigações. Descobriu-se, por exemplo, que os veículos utilizados pela família do prefeito estava em nome do proprietário da casa de carnes de São Carlos, que havia vencido uma concorrência que continha cláusulas impeditivas da livre concorrência, prejudicando comerciantes locais.
Notas fiscais de aquisição de combustível de cidades distantes, cujo produto não havia dado entrada na prefeitura municipal, e cópias de notas fiscais de aluguel de roçadeiras, tratores, de cidades distantes, que ninguém na cidade havia visto, foram sendo cautelosamente analisadas e guardadas. Convocou-se então uma reunião de Conselho para decidir o que fazer. Era consenso que se a AMARRIBO fechasse os olhos para tantas evidências de corrupção, qualquer outra contribuição da organização para a cidade seria irrelevante. Decidiu-se enfrentar o problema.
Assim que a AMARRIBO formalizou as denúncias contra os administradores, começaram os ataques do grupo do prefeito aos membros da organização. Ameaças e tentativas de difamação tentavam destruir a credibilidade das denúncias, mas à medida que a população tomou conhecimento das falcatruas, o movimento ganhou força nas ruas – o que criou uma rede de proteção aos membros da entidade. As denúncias foram sendo comprovadas: as empresas de aluguel de máquinas não existiam, o combustível não dava entrada na prefeitura os cheques de pagamento eram depositados na conta de um vereador envolvido na fraude. Além disso, serviços eram superfaturados, conforme confirmou um dos envolvidos no esquema.
No começo do processo, onze dos treze vereadores da Câmara Municipal apoiavam o prefeito incondicionalmente, mas a pressão popular deu nova configuração à política local. Um pedido de instauração de uma Comissão Especial de Investigação protocolado pela AMARRIBO foi aprovado por unanimidade. E depois de comprovados os fatos, o pedido de instauração do processo de cassação também foi aprovado – novamente por unanimidade. No dia da votação, compareceram à porta da Câmara Municipal cerca de 1,2 mil cidadãos.
O prefeito renunciou em 28 de abril de 2002, e foi preso em 6 de agosto em Rondônia. Após passar dez meses preso preventivamente, foi libertado e agora responde a diversos processos criminais e por improbidade administrativa. Essa longa história é um dos capítulos da cartilha “O COMBATE À CORRUPÇÃO NAS PREFEITURAS DO BRASIL”. A experiência da AMARRIBO foi amplamente divulgada pela imprensa e se tornou um caso emblemático para todo o Brasil. Hoje, mais de 200 instituições e grupos populares trabalham pela transparência na administração pública a partir da história de Ribeirão Bonito e forma a Rede AMARRIBO BRASIL-IFC.
A Amarribo segue seu trabalho em prol do desenvolvimento humano no município de Ribeirão Bonito, apoiando e acompanhando a gestão pública local e participando ativamente de ações como a recuperação do hospital da Santa Casa de Misericórdia. Em 2011, a Amarribo se transformou em Amarribo Brasil e se tornou oa rganização de contato da Transparência Internacional no país, uma organização global de combate à corrupção. A organização continua contando com voluntários e está buscando se profissionalizar para atender os novos e enormes desafios que se apresentam. Tudo isso mostra que ações fundadas na honestidade, na promoção da ética e da probidade têm não só o apoio da sociedade, como são demandadas por ela.