De acordo com a Constituição Federal todo cidadão tem o direito de associação, sendo este um direito fundamental do ser humano. A Reforma Administrativa (1998) teve como objetivo, dentre outros , delimitar a área de atuação do Estado, assim como fortalecer a democracia e a accountability (prestação de contas do Estado para o povo). Assim, se distinguiu as atividades exclusivas do Estado (sociedade política) daquelas não exclusivas que envolvem direitos fundamentais e passam a ser oferecidas por organizações sociais (sociedade civil).
Uma associação ou fundação, sem fins lucrativos, pode ser qualificada como organização social (OS), recebendo tal título da Administração Pública para que ela possa receber determinados benefícios do Poder Público, como isenções fiscais e dotações orçamentárias, conforme previsto na Lei 12.101/2009, para a realização de seus fins, que devem ser necessariamente de interesse da comunidade.
Organizações sociais oferecendo serviços "públicos" é muito mais comum do que muita gente imagina e não é necessário procurar muito para encontrar. Hospitais filantrópicos, por exemplo, são reconhecidos como entidades beneficentes a partir da emissão de um certificado, o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS). O Poder Público reconhecia assim que a organização é filantrópica, sem fins lucrativos e presta atendimento ao público alvo da assistência social.
O que acontece, porém, é que muitas vezes filantropia se confunde com "pilantropia" e quem sai perdendo nessa história é toda a sociedade. Organizações filantrópicas devem servir aos interesses públicos e muitas de fato tem feito isso de forma exemplar, apoiadas por voluntários que exercem papel fundamental para o sucesso dos projetos dessas organizações. Ao mesmo tempo, não é de hoje, que acompanhamos casos de projetos sociais e organizações filantrópicas que de boa causa só possuem a aparência, atendendo unicamente os interesses pessoais de seus fundadores.
São organizações essas que usam do terceiro setor pelas isenções fiscais e demais benefícios, mas que na prática mantém seu caráter privado, visando o lucro. Além dos benefícios se aproveitam da falta de controle e fiscalização do Poder Público sobre as OSs. Essa falta de controle pode ser exemplificada pelos Tribunais de Conta, que ganharam o apelido de "Tribunais de Faz de Conta", uma vez que só fiscalizam a existência de uma prestação de conta e não seu real conteúdo, permitindo fraudes e gastos ineficientes de recurso público e dando um falso atestado de organização filantrópica a organizações mal intencionadas.
Muitos serviços nesses casos são oferecidos de forma precária ou sequer são oferecidos, além de prejudicar a própria sociedade, pelo gasto ineficiente de recursos públicos, prejudica também a imagem de outras organizações sociais sérias que trabalham seriamente visando o interesse público.
Para solucionar esse quadro é preciso que o poder público fortaleça o controle sobre a gestão das OSs e conte com o controle social dos cidadãos para isso, fortalecendo a transparência e a accountability. Com cidadãos empoderados fiscalizando e participando dos Conselhos de Políticas Públicas de seu município, e o controle interno sobre as OSs fortalecido, temos melhor qualidade dos serviços prestados, recursos aplicados de forma mais eficiente e projetos efetivos contribuindo para as necessidades reais da população. Quem ganha somos todos nós.
Nicole Verillo Campello – Estudante do 6° semestre do curso de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), Diretora de Desenvolvimento Institucional da AMARRIBO Brasil. Artigo escrito para a disciplina Gestão de Organizações Sem Fins Lucrativos, ministrada pelo Prof. Dr. Marcelo Arno Nerling.